segunda-feira, 26 de setembro de 2011

LUZ NOS MOVIMENTOS ARTISTICOS

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A luz nos movimentos artisticos

“Se é um lugar-comum dizer que não haveria coisa visível sem a luz, logo se lhe acrescenta um paradoxo, a saber, que a luz pode igualmente permitir a expressão, o fazer ver aos olhos do espírito aquilo que escapa aos olhos do corpo.”
René Huyghe
 Segundo Platão a luz seria, no mundo dos sentidos, o supremo grau, o sinal absoluto de Deus, a verdade e o bem, o belo, já que ela transcende os limites do físico. Se vemos a luz também a pensamos. A oposição da luz e da matéria assumiu desde o homem primitivo uma força simbólica.
 “O homem primitivo sente que o negro, que a sombra, exprimem a matéria, aquilo que é opaco, aquilo que é denso, enquanto a luz traduz, aquilo que é subtil, o que é imaterial. Dos “frescos” pré-históricos do Levante ibérico ou Saara até às figuras negras dos vasos gregos, a mancha sombria equivale à massa.”
A luz já aparece como elemento central neste quadro com a função de chamar a atenção o centro de interesse: está ao fundo, como uma moldura clara onde Cristo aparece com muito bom contraste. É uma primeira demonstração do aspecto iluminação como fortalecedor do centro de interesse.

Fig. 1: Quadro “A Ceia” de Leonardo da Vinci. Abaixo com as linhas predominantes
“Sem dúvida Leonardo da Vinci foi o primeiro a pensar no partido que se poderia tirar da luz, a compreender que o jogo dos valores abria um campo completamente diferente à imaginação artística.”
 O Renascimento ainda não trabalhava sombra e luz, mas claros e escuros. Daí a importância que adquiriu os claros e escuros nas obras de Leonardo da Vinci.
“Rafael revela aqui sua maestria na utilização da luz, no uso expressivo do claro-escuro. Nesse sentido é uma das cenas nocturnas mais imaginativas da história da arte: os tons pálidos da noite, a tocha e, sobretudo, a brilhante luminosidade da aura sobrenatural dos anjos em contraste com o fundo sombrio estão magistralmente tratados (…) Todas esses característicos dão forte impacto a essa obra, uma das mais importantes de Rafael.”

Fig.2: “A libertação de São Pedro” de Rafael
 A escola barroca começa a incluir a sombra e luz iniciando um novo conceito na representação pictórica: a textura da imagem. Até então as cenas eram representativas respeitando-se a simetria, triangulação e perspectiva. Agora a textura passava a enriquecer as representações dando-lhes a impressão da tridimensionalidade. Aspecto esse que transferimos para a televisão.  
“Marca registada de claro e escuro, Caravaggio surpreende pelo uso excessivo do claro-escuro. Suas figuras são iluminadas por uma forte e arrebatadora luz, que imprime um colorido cheio de contrastes, conferindo maior dramaticidade à cena.”
“A luz na arte de Caravaggio é, por vezes, muito mais do que simples meio de iluminação: é uma força activa. O poder de Cristo em Vocação de São Mateus manifesta-se pelo agudo e cortante fecho de luz que acompanha sua a presença.”

Fig. 3: Quadro “Vocação de São Mateus” de Caravaggio.
 O que destacamos neste momento é a nova conceituação da luz na composição pictórica. Como demonstraremos ainda neste trabalho, a técnica de iluminação de Caravaggio é utilizada na produção cinematográfica e televisiva nas cenas onde a alta dramaticidade e suspense são necessárias, para levar ao telespectador sensações de preocupação e terror.
 Velázquez, artista espanhol, pinta em 1656 o quadro “As Meninas”, onde antecipa a técnica de iluminação dos impressionistas. Já apresenta a luz como um elemento gerador, proporcionando as sombras organizadas para o lado contrário da fonte de luz.  
“Esta obra também aponta para o futuro, porque Velázquez conferiu à luz um papel de destaque, antecipando assim a questão fundamental dos impressionistas.”

Fig. 4: Quadro “As Meninas” de Velásquez
Vermeer, holandês que viveu de 1632 à 1675, aparece como ponto importantíssimo nesta relação das artes plásticas com a iluminação para a televisão. Os seus quadros são trabalhados com as técnicas assimiladas anteriormente, porém introduz o conceito da sombra e os reflexos da iluminação como representação do ambiente real. Supõe-se que Vermeer utilizou-se da câmara escura como base para representar as cenas. A câmara escura foi inicialmente utilizada num quarto totalmente escuro com um pequeno furo na parede. Por este furo os raios luminosos projectavam na parede interna do quarto a paisagem “enquadrada”. Esta projecção era a referência para a representação pictórica. Atribui-se que, pelas amizades entre Vermeer e Anthony van Leeuwenhoeck, um cientista que estudava lentes e microscópios, Vermeer conhecesse os experimentos ópticos que levaram à criação de uma câmara escura com lentes. O princípio de uma câmara fotográfica não tinha filmes, mas projectava a cena enquadrada em uma tela que servia de referência ao pintor.

Fig. 5: Quarto escuro
Com os referenciais adequados, Vermeer trabalhou nas suas obras com os efeitos característicos de uma câmara fotográfica: o primeiro plano aparecia sempre em tamanho maior que o segundo plano, característica da lente grande-angular; e os pontos luminosos da cena apareciam levemente desfocados, o que a olho nu não se percebe com tamanha precisão. Esta técnica veio a ser utilizada posteriormente pelos impressionistas.
“Ele trabalha magistralmente o claro-escuro, a luz e a sombra, criando um espaço de perfeita harmonia.”

Fig. 6: Quadro “O Copo de Vinho” de Vermeer
 “Luz e sombra põem em contraste o horror atroz.”
No Romantismo, Goya, espanhol (1746-1828), utiliza-se da sombra e luz já como alusão ao horror. A sua obra “Os fuzilamentos do Três de Maio de 1808″ é iluminada por um lampião como sendo a única fonte de luz, mostrando na penumbra o horror dos soldados apontando as suas armas e na figura central um espanhol com braços abertos como que, num gesto semelhante a Jesus Cristo, está sendo injustiçado. Este elemento está em destaque pelo fecho de luz mais forte do lampião que o atinge. Os demais elementos, em expressões de desespero e horror ficam quase que na penumbra.

Fig. 7: Quadro obra “Os fuzilamentos do Três de Maio de 1808″ de Goya
Desde esta época cenas de horror, suspense, mistérios já vem de alguma forma sendo representadas como escuras, tendo um ponto de luz como fonte de iluminação para gerar este tipo de emoção. A televisão denomina este tipo de iluminação como “luz recortada”: um só ponto de luz gerando sombras marcadas no lado oposto ao iluminado. O uso de pouca cor nas obras de Goya também gera estes tipos de emoção.
Os impressionistas trocaram os estúdios pelas técnicas ao ar livre. Usavam cores vivas e davam a impressão que a luz reflectia nas superfícies naturais.
“Os impressionistas deram nova concepção à luminosidade e, mais do que a cor, privilegiaram a luz como objecto essencial de sua pintura, definindo formas com borrões de tinta.”
Van Gogh (1853-1890) encontrou no movimento impressionista a adequação dos seus objectivos. O uso da cor excessiva, às vezes usando o tubo de tinta directamente espremido na tela para depois modelar a tinta espessa com o pincel proporcionou uma nova técnica: o empaste, marca registada dos seus trabalhos. Para o quadro “Terraço de café à noite” Van Gogh chegou a utilizar velas na aba do chapéu para iluminar o ambiente proporcionando-lhe um clima mais aconchegante este foi conseguido não só pelos fortes borrões mas pelo contraste obtido pelas formas em relevo graças à forte camada de tinta vislumbrando tom sobre tom. Na TV observa-se muito o cuidado em destacar o objecto em primeiro plano usando um fundo em segundo plano bastante contrastado em relação ao primeiro.  

Fig. 8: “Terraço de Café à Noite”
“Como pintavam ao ar livre os impressionistas não podiam controlar a luz e, certamente por isso, imprimiam um ritmo mais veloz aos seus trabalhos, um ritmo diferente do habitual entre as quatro paredes de um estúdio.”
 O mesmo ocorre hoje com a televisão: a gravação em estúdio permite o controlo total da luz, permitindo obter os resultados desejados a nível de ambientação.

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